Iniciar um negócio próprio pode deixar qualquer um extremamente animado ou de cabelo em pé. Geralmente uma coisa, depois a outra. A ideia de não ter patrão e de (teoricamente) ganhar mais dinheiro é desafiadora, assim como a perspectiva de executar um projeto seu, que ficou dias, meses - e, quem sabe, anos - amadurecendo e esperando o momento certo para acontecer. Normalmente, o novo empreendedor fica inebriado com as perspectivas. Só que não basta uma boa ideia. Para dar certo, ela precisa ser bem planejada e bem executada. E é exatamente nesse segundo momento que os problemas costumam aparecer e desanimar (ou enlouquecer) os empreendedores de primeira viagem.
A confusão mental que geralmente acontece durante a abertura do primeiro negócio é bem definida por David Anderson, advogado americano especializado em direito empresarial. "Não há nada que se assemelhe mais à sensação de abrir um negócio próprio do que o nascimento do primeiro filho", diz Anderson. "Você experimenta as mesmas emoções: júbilo, ansiedade, alegria, pânico e confusão." Nesse emaranhado de sentimentos, os enganos são quase inevitáveis.
São esses enganos que explicam boa parte dos insucessos das empresas recém-criadas, indiferentemente do ramo de atuação. Entre os maiores pecados cometidos pelos futuros donos de uma casa noturna, de uma confecção ou de uma franquia estão a falta de planejamento, o dimensionamento errado do mercado e as divergências entre os sócios.
Os erros fatais dos empreendedores
De acordo com pesquisas feitas pelo Sebrae, entidade que apóia a iniciativa do empreendedor de pequeno porte, 39% dos novos empreendimentos do Estado de São Paulo morrem antes de completar o primeiro ano de atividade. Ao final de três anos de funcionamento, 56% deles já terão deixado de existir, segundo a entidade. Mas, na opinião de especialistas da área, o número divulgado pelo Sebrae é ainda menor do que o verificado na prática - uma mortalidade de 70% nos primeiros três anos. A realidade também é dura nos países que têm tradição empreendedora, como os Estados Unidos. Lá, a quebra de empresas novatas é menor do que no Brasil, mas é também muito alta. As chances de elas sobreviverem ao primeiro ano, por exemplo, são de 20%. Os dados são de Michael Levy e Barton Weitz, consultores americanos e autores do livro Administração de Varejo.
Quais são mesmo esses erros tão comuns que devem ser evitados a qualquer custo? Abaixo listamos as análises de diversos especialistas que acabam levantando sete principais equívocos cometidos ao abrir uma empresa:
Escolher o sócio errado
Esse talvez seja o maior erro cometido pelos empreendedores iniciantes. É comum ouvir pessoas dizerem "sócio nunca mais" ou "sociedade desfeita é pior que divórcio". O problema não é a complexidade de uma sociedade, mas a escolha do sócio errado. O primeiro equívoco é achar que a sociedade vai dar certo só pelo fato de seu parceiro ser um colega de faculdade, de profissão, um amigo ou parente. "Os sócios devem ter conhecimentos complementares e ser escolhidos por suas qualidades profissionais", diz Adelino de Bortoli Neto, professor da Fundação Instituto de Administração da USP, com mestrado e doutorado em empreendedorismo.
Isso significa que, se um dos sócios entende de vendas, o ideal é que o outro seja craque em finanças. Se um é bom na teoria, o outro deveria conhecer bem a prática. Mas não é essa avaliação racional que costuma unir duas ou mais pessoas em torno de um negócio. Depois de conversas iniciadas numa mesa de bar, numa reunião de família ou no trabalho, os interessados concordam com uma concepção inicial do empreendimento e pronto: resolvem ser sócios. Não é de espantar que muitas parcerias fracassem.
Em quase 40 anos de consultoria e pesquisas nessa área, Bortoli Neto chegou a uma conclusão preocupante: 95% das sociedades das empresas que apresentam problemas não foram formadas de maneira adequada. Que o diga a psicopedagoga Valéria, 51 anos, que prefere não ter seu sobrenome divulgado. Em 1999, ela e uma colega de profissão - as duas se conheceram num curso de especialização - estavam trocando ideias sobre como oferecer um serviço novo em sua área de atuação. Decidiram abrir um espaço de lazer onde os pais pudessem deixar seus filhos enquanto faziam compras, cursos ou compareciam a compromissos de trabalho. A ideia parecia estar indo pelo caminho certo. Mas as divergências na sociedade começaram a surgir.
Segundo Valéria, nenhuma das duas tinha conhecimentos profundos de administração ou de marketing, o que seria necessário para divulgar e gerir o negócio. "Minha sócia tinha uma visão muito pedagógica e pouco empreendedora", diz. Na avaliação de Valéria, enquanto uma tentava descobrir maneiras de desenvolver a empresa, mesmo sem ter muitos conhecimentos, a outra achava que o empreendimento deveria estar focado apenas na questão pedagógica. Sem o interesse comercial, o negócio não se expandiu como as duas imaginavam e a sócia de Valéria foi ficando cada vez mais desanimada com os resultados. Os desentendimentos se tornaram freqüentes. Foi preciso até colocar advogados para intermediar as conversas, já que as duas não conseguiam mais chegar a um consenso. O que faltou, na visão de Valéria, foi uma conversa inicial que não contemplasse apenas a ideologia do negócio mas também as características profissionais e de personalidade de cada uma, assim como definir como seria a administração do projeto.
Não ter um plano de negócios
Não há omissão mais grave para um iniciante no mundo dos negócios do que a falta de um completo plano antes de iniciar os investimentos. Segundo os especialistas, não é raro investidores acharem que para começar um novo empreendimento é só ter uma ideia, arrumar algum dinheiro, começar a tocar o projeto, com ou sem sócio, e depois tudo se resolve. "Algumas pessoas são intuitivas e acabam se dando bem, mas a maioria precisa de um cronograma minucioso para ser bem-sucedida", diz Armando Lourenzo Moreira Júnior, consultor de empresas e dono da Conhecimento - Pesquisas e Avaliações Estratégicas, de São Paulo. Segundo ele, os planos de negócios (os tão falados business plans) raramente são feitos e, mesmo quando o empreendedor decide fazê-lo, costuma ser de uma forma precária. Ou seja, o planejamento acaba falhando num ou noutro ponto e o sucesso do projeto fica comprometido.
Quem não faz um plano de negócios detalhado geralmente fica sem conhecer por completo o mercado em que pretende trabalhar. Inúmeros investidores não se informam adequadamente sobre a real demanda do produto ou do serviço que querem oferecer. Eles não sabem qual o perfil de cliente que desejam atingir nem como vai funcionar a empresa nos mínimos detalhes: da matéria-prima à entrega do produto ou serviço. Um plano que não contenha os detalhes de quem vai compor a diretoria, quantos e quem serão os empregados e os riscos potenciais do projeto também não está completo. A falta de um levantamento financeiro criterioso pode esconder sua inviabilidade econômica. "Em alguns casos, mesmo a projeção mais otimista de lucro não paga o custo do negócio", diz Moreira Júnior. Ou seja, esse suposto empresário estaria começando um negócio fadado ao fracasso. Isso não significa que planejar detalhadamente a abertura de um novo empreendimento garanta seu êxito. Mas é um bom passo nessa direção.
Desconhecer o mercado
Esse é um item que faz parte do plano de negócios. Mas ele é tão importante e tão negligenciado que merece um capítulo à parte. Conhecer o mercado significa mapear tudo o que se refere ao assunto, desde as características do produto ou serviço em questão (como giro, estoque, sazonalidade) e do cliente até os melhores pontos para instalar a empresa, os documentos necessários etc.
Pesquisa teórica feita, muitas vezes o futuro empresário peca por não ir a campo conferir como funcionam as empresas do ramo e quais os principais problemas que elas enfrentam. É importantíssimo conhecê-los. Quem não faz esse tipo de levantamento deixa de saber em quanto tempo se consegue o retorno do investimento e quais são os picos e os vales possíveis. Brinca com a sorte também quem não procura informações sobre como funciona o relacionamento com os fornecedores.
Carlos José Righi, de 54 anos, de São Paulo, é um exemplo de quem acabou numa enrascada por falta de conhecimento do mercado. Quando fechou a confecção que manteve durante cinco anos, o pequeno empresário decidiu ter um posto de gasolina. Desta vez preferiu comprar o ponto de terceiros. Mas ele não conhecia nada sobre o ramo. Não tinha a menor ideia, por exemplo, de que os impostos cobrados na venda de combustíveis são dos mais altos. Righi conta que acabou, sem saber, herdando do antigo proprietário uma enxurrada de impostos atrasados. Juntou-se a isso a dificuldade de administrar o negócio, que não era tão simples quanto ele imaginava. Righi acabou ficando com o nome sujo na praça, perdeu um apartamento e o próprio posto. Agora trabalha em um restaurante para se recuperar financeiramente. E afirma: "Vou abrir outro negócio, mas na área de alimentação, que agora conheço profundamente".
Não planejar saídas de emergência
E se o plano de negócios não der certo? Não se trata de ser pessimista. É uma questão de sobrevivência. Ao fazer um cronograma detalhado de investimento, a maioria dos empreendedores tem a certeza - e não apenas a expectativa - de que tudo correrá conforme planejado. Mas quase nunca é assim.
Um plano de contingência funciona como a medicina preventiva. Você pensa em como cuidar de órgãos debilitados ou mais frágeis antes de a doença aparecer e atacar o organismo como um todo. Se chegar a esse ponto, só mesmo um forte antibiótico para resolver a situação.
Esse plano emergencial pode contemplar vários aspectos. Ele não precisa necessariamente ser radical, como abandonar a ideia de montar uma loja de perfumes importados por causa da alta do dólar e partir para o ramo de confecção com algodão 100% nacional. Ao contrário, precisa prever alternativas para o caso de haver uma mudança no câmbio, mesmo que o mercado não apresente sinais de desvalorização da moeda nacional. "Uma saída, nesse caso, seria ampliar a linha de produtos, incluindo itens de fabricação nacional", diz o consultor Moreira Júnior.
Geralmente são pequenas minúcias que podem colocar tudo a perder. Deixar de prever um capital extra, de pelo menos 10% do investimento inicial, não estabelecer como fica a sociedade caso um dos parceiros resolva sair do negócio (ou se um deles morrer) e deixar de analisar opções para o caso de eventuais problemas com fornecedores costumam ser equívocos comuns.
Subestimar o capital inicial
Os cálculos para saber o valor que um investidor precisará para iniciar o próprio empreendimento deveriam incluir, além dos custos de abertura do estabelecimento propriamente dito, o capital de giro dos primeiros dois a três anos, que é o tempo médio estimado para um negócio novo começar a dar lucro. Há casos em que o futuro empreendedor simplesmente não faz contas. Reúne capital próprio, de sócios, às vezes da família, e começa a aplicar sem critérios muito definidos. O dinheiro acaba no meio do caminho e muitas vezes não dá nem para desistir do projeto, sob o risco de perder tudo que já se investiu. "Esse tipo de empreendedor, o reativo, é muito comum no Brasil", diz o consultor Moreira Júnior. "Ele vai reagindo de acordo com os acontecimentos, sem se planejar."
O tipo auto-suficiente, segundo o consultor, também costuma cometer deslizes graves. As pessoas desse tipo, em geral, fazem mil contas, acham que sabem como definir todos os custos do negócio, mas não buscam informações consistentes no mercado. Normalmente, quando algo vai mal, não conseguem identificar o problema. Os autossuficientes podem esquecer itens básicos importantes, como prever gastos para fazer uma reforma ou comprar o estoque inicial (que costuma chegar só depois de 60 dias, apesar de ser pago em 30 dias).
Nas situações em que se previu um valor, mas foi necessário usar o dobro de dinheiro para colocar o projeto em pé, o que muitos empreendedores fazem? Recorrem aos bancos e ficam reféns de juros estratosféricos. "Achei que ia investir metade do que efetivamente precisei", diz Aluísio Hungria, de 29 anos, há um ano dono de um bar no bairro de Moema, Zona Sul de São Paulo. Ele e seu sócio acharam que ganhariam uma chopeira da Brahma como parte do patrocínio combinado previamente com a empresa. Mas eles não verificaram se a tal chopeira que constava no contrato de parceria era a mais adequada para seu bar. Resultado: tiveram que desembolsar 12 000 reais para comprar uma do tipo que eles precisavam. O valor, claro, não estava previsto no plano inicial. A saída foi buscar um empréstimo bancário, pagando juros de 3% ao mês. Até hoje, conta Hungria, não conseguiram se livrar do débito.
Não ter um foco definido
Ninguém é obrigado a continuar num caminho que vai dar num precipício só para não sair da rota traçada. Mas mudar de trajeto o tempo todo pode ser extremamente prejudicial para os negócios. Se um empreendedor decide investir um dia na área de cosméticos, no dia seguinte em educação e no terceiro dia em imóveis, dificilmente ele conseguirá êxito. Afinal, um projeto de empreendimento exige tempo e dedicação para dar certo. E ficar mudando de ideia o tempo todo não parece ser o comportamento ideal. Alguns consultores acreditam que a diversificação é o caminho mais adequado para o negócio próprio. Outros, que o melhor é ter um foco bem definido. Mas ambas as correntes concordam que, pelo menos no início, o ideal é ter um negócio pequeno e direcionado, com produtos inovadores dentro daquele nicho específico. "Se o empreendedor iniciante já tem dificuldade para gerenciar um negócio, imagine vários", afirma Moreira Júnior.
O tamanho do empreendimento também está ligado ao foco. Muitos investidores mal começam um projeto e já querem ampliá-lo. Se não tiverem capital e estrutura para tanto, podem acabar numa arapuca. Moreira Júnior cita o exemplo de um distribuidor de mercadorias que atendia pequenos varejos, mas acabou fechando acordo com um supermercado de médio porte. "Ele começou a ser exigido além de sua possibilidade, precisou pegar dinheiro emprestado para não perder o cliente e acabou endividado", diz.
Não saber lidar com os riscos
Abrir um negócio implica riscos, que podem ser maiores ou menores dependendo do tipo de atividade. Mas que eles existem, existem. Deixar de levar o risco em consideração pode ser um convite para muitos problemas na administração de um empreendimento. Uma inadimplência elevada, por exemplo, é um risco que deveria estar previsto num plano de contingência. Você pode, por exemplo, ficar um ou dois meses praticamente sem dinheiro em caixa. Ganhar mais num dia e perder um pouco no outro são situações comuns. Então, de nada adianta se desesperar a cada oscilação nas vendas ou com um pequeno aumento na inadimplência. Veja o que escreveu o advogado americano David Anderson em um artigo para a revista Entrepreneur, uma referência para o empreendedor americano: "Se você não consegue lidar com a ideia de risco, não deve iniciar um negócio próprio". E aí, vai encarar?
A confusão mental que geralmente acontece durante a abertura do primeiro negócio é bem definida por David Anderson, advogado americano especializado em direito empresarial. "Não há nada que se assemelhe mais à sensação de abrir um negócio próprio do que o nascimento do primeiro filho", diz Anderson. "Você experimenta as mesmas emoções: júbilo, ansiedade, alegria, pânico e confusão." Nesse emaranhado de sentimentos, os enganos são quase inevitáveis.
São esses enganos que explicam boa parte dos insucessos das empresas recém-criadas, indiferentemente do ramo de atuação. Entre os maiores pecados cometidos pelos futuros donos de uma casa noturna, de uma confecção ou de uma franquia estão a falta de planejamento, o dimensionamento errado do mercado e as divergências entre os sócios.
Os erros fatais dos empreendedores
De acordo com pesquisas feitas pelo Sebrae, entidade que apóia a iniciativa do empreendedor de pequeno porte, 39% dos novos empreendimentos do Estado de São Paulo morrem antes de completar o primeiro ano de atividade. Ao final de três anos de funcionamento, 56% deles já terão deixado de existir, segundo a entidade. Mas, na opinião de especialistas da área, o número divulgado pelo Sebrae é ainda menor do que o verificado na prática - uma mortalidade de 70% nos primeiros três anos. A realidade também é dura nos países que têm tradição empreendedora, como os Estados Unidos. Lá, a quebra de empresas novatas é menor do que no Brasil, mas é também muito alta. As chances de elas sobreviverem ao primeiro ano, por exemplo, são de 20%. Os dados são de Michael Levy e Barton Weitz, consultores americanos e autores do livro Administração de Varejo.
Quais são mesmo esses erros tão comuns que devem ser evitados a qualquer custo? Abaixo listamos as análises de diversos especialistas que acabam levantando sete principais equívocos cometidos ao abrir uma empresa:
Escolher o sócio errado
Esse talvez seja o maior erro cometido pelos empreendedores iniciantes. É comum ouvir pessoas dizerem "sócio nunca mais" ou "sociedade desfeita é pior que divórcio". O problema não é a complexidade de uma sociedade, mas a escolha do sócio errado. O primeiro equívoco é achar que a sociedade vai dar certo só pelo fato de seu parceiro ser um colega de faculdade, de profissão, um amigo ou parente. "Os sócios devem ter conhecimentos complementares e ser escolhidos por suas qualidades profissionais", diz Adelino de Bortoli Neto, professor da Fundação Instituto de Administração da USP, com mestrado e doutorado em empreendedorismo.
Isso significa que, se um dos sócios entende de vendas, o ideal é que o outro seja craque em finanças. Se um é bom na teoria, o outro deveria conhecer bem a prática. Mas não é essa avaliação racional que costuma unir duas ou mais pessoas em torno de um negócio. Depois de conversas iniciadas numa mesa de bar, numa reunião de família ou no trabalho, os interessados concordam com uma concepção inicial do empreendimento e pronto: resolvem ser sócios. Não é de espantar que muitas parcerias fracassem.
Em quase 40 anos de consultoria e pesquisas nessa área, Bortoli Neto chegou a uma conclusão preocupante: 95% das sociedades das empresas que apresentam problemas não foram formadas de maneira adequada. Que o diga a psicopedagoga Valéria, 51 anos, que prefere não ter seu sobrenome divulgado. Em 1999, ela e uma colega de profissão - as duas se conheceram num curso de especialização - estavam trocando ideias sobre como oferecer um serviço novo em sua área de atuação. Decidiram abrir um espaço de lazer onde os pais pudessem deixar seus filhos enquanto faziam compras, cursos ou compareciam a compromissos de trabalho. A ideia parecia estar indo pelo caminho certo. Mas as divergências na sociedade começaram a surgir.
Segundo Valéria, nenhuma das duas tinha conhecimentos profundos de administração ou de marketing, o que seria necessário para divulgar e gerir o negócio. "Minha sócia tinha uma visão muito pedagógica e pouco empreendedora", diz. Na avaliação de Valéria, enquanto uma tentava descobrir maneiras de desenvolver a empresa, mesmo sem ter muitos conhecimentos, a outra achava que o empreendimento deveria estar focado apenas na questão pedagógica. Sem o interesse comercial, o negócio não se expandiu como as duas imaginavam e a sócia de Valéria foi ficando cada vez mais desanimada com os resultados. Os desentendimentos se tornaram freqüentes. Foi preciso até colocar advogados para intermediar as conversas, já que as duas não conseguiam mais chegar a um consenso. O que faltou, na visão de Valéria, foi uma conversa inicial que não contemplasse apenas a ideologia do negócio mas também as características profissionais e de personalidade de cada uma, assim como definir como seria a administração do projeto.
Não ter um plano de negócios
Não há omissão mais grave para um iniciante no mundo dos negócios do que a falta de um completo plano antes de iniciar os investimentos. Segundo os especialistas, não é raro investidores acharem que para começar um novo empreendimento é só ter uma ideia, arrumar algum dinheiro, começar a tocar o projeto, com ou sem sócio, e depois tudo se resolve. "Algumas pessoas são intuitivas e acabam se dando bem, mas a maioria precisa de um cronograma minucioso para ser bem-sucedida", diz Armando Lourenzo Moreira Júnior, consultor de empresas e dono da Conhecimento - Pesquisas e Avaliações Estratégicas, de São Paulo. Segundo ele, os planos de negócios (os tão falados business plans) raramente são feitos e, mesmo quando o empreendedor decide fazê-lo, costuma ser de uma forma precária. Ou seja, o planejamento acaba falhando num ou noutro ponto e o sucesso do projeto fica comprometido.
Quem não faz um plano de negócios detalhado geralmente fica sem conhecer por completo o mercado em que pretende trabalhar. Inúmeros investidores não se informam adequadamente sobre a real demanda do produto ou do serviço que querem oferecer. Eles não sabem qual o perfil de cliente que desejam atingir nem como vai funcionar a empresa nos mínimos detalhes: da matéria-prima à entrega do produto ou serviço. Um plano que não contenha os detalhes de quem vai compor a diretoria, quantos e quem serão os empregados e os riscos potenciais do projeto também não está completo. A falta de um levantamento financeiro criterioso pode esconder sua inviabilidade econômica. "Em alguns casos, mesmo a projeção mais otimista de lucro não paga o custo do negócio", diz Moreira Júnior. Ou seja, esse suposto empresário estaria começando um negócio fadado ao fracasso. Isso não significa que planejar detalhadamente a abertura de um novo empreendimento garanta seu êxito. Mas é um bom passo nessa direção.
Desconhecer o mercado
Esse é um item que faz parte do plano de negócios. Mas ele é tão importante e tão negligenciado que merece um capítulo à parte. Conhecer o mercado significa mapear tudo o que se refere ao assunto, desde as características do produto ou serviço em questão (como giro, estoque, sazonalidade) e do cliente até os melhores pontos para instalar a empresa, os documentos necessários etc.
Pesquisa teórica feita, muitas vezes o futuro empresário peca por não ir a campo conferir como funcionam as empresas do ramo e quais os principais problemas que elas enfrentam. É importantíssimo conhecê-los. Quem não faz esse tipo de levantamento deixa de saber em quanto tempo se consegue o retorno do investimento e quais são os picos e os vales possíveis. Brinca com a sorte também quem não procura informações sobre como funciona o relacionamento com os fornecedores.
Carlos José Righi, de 54 anos, de São Paulo, é um exemplo de quem acabou numa enrascada por falta de conhecimento do mercado. Quando fechou a confecção que manteve durante cinco anos, o pequeno empresário decidiu ter um posto de gasolina. Desta vez preferiu comprar o ponto de terceiros. Mas ele não conhecia nada sobre o ramo. Não tinha a menor ideia, por exemplo, de que os impostos cobrados na venda de combustíveis são dos mais altos. Righi conta que acabou, sem saber, herdando do antigo proprietário uma enxurrada de impostos atrasados. Juntou-se a isso a dificuldade de administrar o negócio, que não era tão simples quanto ele imaginava. Righi acabou ficando com o nome sujo na praça, perdeu um apartamento e o próprio posto. Agora trabalha em um restaurante para se recuperar financeiramente. E afirma: "Vou abrir outro negócio, mas na área de alimentação, que agora conheço profundamente".
E se o plano de negócios não der certo? Não se trata de ser pessimista. É uma questão de sobrevivência. Ao fazer um cronograma detalhado de investimento, a maioria dos empreendedores tem a certeza - e não apenas a expectativa - de que tudo correrá conforme planejado. Mas quase nunca é assim.
Um plano de contingência funciona como a medicina preventiva. Você pensa em como cuidar de órgãos debilitados ou mais frágeis antes de a doença aparecer e atacar o organismo como um todo. Se chegar a esse ponto, só mesmo um forte antibiótico para resolver a situação.
Esse plano emergencial pode contemplar vários aspectos. Ele não precisa necessariamente ser radical, como abandonar a ideia de montar uma loja de perfumes importados por causa da alta do dólar e partir para o ramo de confecção com algodão 100% nacional. Ao contrário, precisa prever alternativas para o caso de haver uma mudança no câmbio, mesmo que o mercado não apresente sinais de desvalorização da moeda nacional. "Uma saída, nesse caso, seria ampliar a linha de produtos, incluindo itens de fabricação nacional", diz o consultor Moreira Júnior.
Geralmente são pequenas minúcias que podem colocar tudo a perder. Deixar de prever um capital extra, de pelo menos 10% do investimento inicial, não estabelecer como fica a sociedade caso um dos parceiros resolva sair do negócio (ou se um deles morrer) e deixar de analisar opções para o caso de eventuais problemas com fornecedores costumam ser equívocos comuns.
Subestimar o capital inicial
Os cálculos para saber o valor que um investidor precisará para iniciar o próprio empreendimento deveriam incluir, além dos custos de abertura do estabelecimento propriamente dito, o capital de giro dos primeiros dois a três anos, que é o tempo médio estimado para um negócio novo começar a dar lucro. Há casos em que o futuro empreendedor simplesmente não faz contas. Reúne capital próprio, de sócios, às vezes da família, e começa a aplicar sem critérios muito definidos. O dinheiro acaba no meio do caminho e muitas vezes não dá nem para desistir do projeto, sob o risco de perder tudo que já se investiu. "Esse tipo de empreendedor, o reativo, é muito comum no Brasil", diz o consultor Moreira Júnior. "Ele vai reagindo de acordo com os acontecimentos, sem se planejar."
O tipo auto-suficiente, segundo o consultor, também costuma cometer deslizes graves. As pessoas desse tipo, em geral, fazem mil contas, acham que sabem como definir todos os custos do negócio, mas não buscam informações consistentes no mercado. Normalmente, quando algo vai mal, não conseguem identificar o problema. Os autossuficientes podem esquecer itens básicos importantes, como prever gastos para fazer uma reforma ou comprar o estoque inicial (que costuma chegar só depois de 60 dias, apesar de ser pago em 30 dias).
Nas situações em que se previu um valor, mas foi necessário usar o dobro de dinheiro para colocar o projeto em pé, o que muitos empreendedores fazem? Recorrem aos bancos e ficam reféns de juros estratosféricos. "Achei que ia investir metade do que efetivamente precisei", diz Aluísio Hungria, de 29 anos, há um ano dono de um bar no bairro de Moema, Zona Sul de São Paulo. Ele e seu sócio acharam que ganhariam uma chopeira da Brahma como parte do patrocínio combinado previamente com a empresa. Mas eles não verificaram se a tal chopeira que constava no contrato de parceria era a mais adequada para seu bar. Resultado: tiveram que desembolsar 12 000 reais para comprar uma do tipo que eles precisavam. O valor, claro, não estava previsto no plano inicial. A saída foi buscar um empréstimo bancário, pagando juros de 3% ao mês. Até hoje, conta Hungria, não conseguiram se livrar do débito.
Não ter um foco definido
Ninguém é obrigado a continuar num caminho que vai dar num precipício só para não sair da rota traçada. Mas mudar de trajeto o tempo todo pode ser extremamente prejudicial para os negócios. Se um empreendedor decide investir um dia na área de cosméticos, no dia seguinte em educação e no terceiro dia em imóveis, dificilmente ele conseguirá êxito. Afinal, um projeto de empreendimento exige tempo e dedicação para dar certo. E ficar mudando de ideia o tempo todo não parece ser o comportamento ideal. Alguns consultores acreditam que a diversificação é o caminho mais adequado para o negócio próprio. Outros, que o melhor é ter um foco bem definido. Mas ambas as correntes concordam que, pelo menos no início, o ideal é ter um negócio pequeno e direcionado, com produtos inovadores dentro daquele nicho específico. "Se o empreendedor iniciante já tem dificuldade para gerenciar um negócio, imagine vários", afirma Moreira Júnior.
O tamanho do empreendimento também está ligado ao foco. Muitos investidores mal começam um projeto e já querem ampliá-lo. Se não tiverem capital e estrutura para tanto, podem acabar numa arapuca. Moreira Júnior cita o exemplo de um distribuidor de mercadorias que atendia pequenos varejos, mas acabou fechando acordo com um supermercado de médio porte. "Ele começou a ser exigido além de sua possibilidade, precisou pegar dinheiro emprestado para não perder o cliente e acabou endividado", diz.
Não saber lidar com os riscos
Abrir um negócio implica riscos, que podem ser maiores ou menores dependendo do tipo de atividade. Mas que eles existem, existem. Deixar de levar o risco em consideração pode ser um convite para muitos problemas na administração de um empreendimento. Uma inadimplência elevada, por exemplo, é um risco que deveria estar previsto num plano de contingência. Você pode, por exemplo, ficar um ou dois meses praticamente sem dinheiro em caixa. Ganhar mais num dia e perder um pouco no outro são situações comuns. Então, de nada adianta se desesperar a cada oscilação nas vendas ou com um pequeno aumento na inadimplência. Veja o que escreveu o advogado americano David Anderson em um artigo para a revista Entrepreneur, uma referência para o empreendedor americano: "Se você não consegue lidar com a ideia de risco, não deve iniciar um negócio próprio". E aí, vai encarar?
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